Ultimamente temos visto como o discurso do bem-estar está em evidência. Nas notícias, nas redes sociais, nos livros e nas conversas durante o café. Fala-se em cuidar de si, desacelerar, respirar. E, de fato, é necessário, urgente e há algo profundamente verdadeiro nisso.
Mas também percebemos uma inversão curiosa: o autocuidado, que nasceu como gesto de gentileza, virou mais uma forma de performance.
Como se o “viver bem” precisasse ser medido, exibido, comparado. E aí, em vez de alívio, nasce mais uma exigência e autocobrança silenciosa, mascarada e sufocante.
Nesse texto de hoje eu quero compartilhar sete percepções — inquietações, talvez — sobre o que me incomoda nesse novo modelo de bem-estar que parece mais preocupado em parecer saudável do que em ser verdadeiro e autêntico.
1. Quando o “cuidar de si” vira uma meta
O autocuidado quando vira uma métrica: número de passos, horas de sono, minutos de meditação… O esporte da moda, treinar de nova, ter um relógio específico…
O gesto que deveria ser suave torna-se cobrança.
E se não faço parte, se falho… me culpo — como se o bem-estar fosse mais uma métrica de produtividade e de fazer parte.
Enquanto o verdadeiro cuidado consigo não se mede, nem se compara, se sente.
2. O autocuidado instagramável
Cenas prontas: velas acesas, livro aberto, xícara de chá, copo de vidro com tampa e canudo — tudo perfeito para o feed.
Só que, muitas vezes, o que é mostrado não é o que é vivido.
Transformamos o descanso em performance estética. Tudo precisa ser mostrado
O “eu me cuido” na verdade se torna “eu me mostro como alguém que se cuida”.
3. Misturar bem estar com estética
Cuidar do corpo é diferente de cuidar da estética. A utilização de termos como “Clean eating”, detox, lifestyle… os suplementos e apps que prometem “corpo saudável = corpo fino”, acabam evidenciando um saudável estilizado, com foco maior em aparência do que em saúde.
4. A comparação com o outro “zen”
Vivemos cercados de pessoas que parecem ter dominado a arte do equilíbrio.
E é fácil sentir que estamos atrasados, que falta algo, que deveríamos estar mais calmos, mais leves, mais plenos, mais alegres…
Mas o bem-estar não é uma competição. É você com você mesmo. Se acolhendo e se respeitando.
Não há ranking da serenidade.
5. O autocuidado vendido como produto
O mercado entendeu rápido: bem-estar dá lucro.
E assim, o “cuidar-se” virou consumo — cremes, apps, retiros, velas, roupas…
Nada disso é errado, claro. Mas é perigoso quando o autocuidado se limita ao que pode ser comprado. Por que ele vai muito além disso.
O cuidado profundo é gratuito: começa no tempo, no corpo, na escuta. No autoconhecimento.
6. O mito da positividade constante
Há quem confunda bem-estar com estar bem o tempo todo.
O cuidado genuíno inclui o desconforto, a pausa, a tristeza.
É possível cuidar-se enquanto se sofre.
Nem todo dia bom precisa ser bonito — basta ser verdadeiro.
7. O esquecimento do propósito
Por fim, talvez o erro mais sutil: transformar o bem-estar em fim, e não em meio.
Cuidar de si é importante, mas para quê?
Para viver com mais presença, para estar disponível ao outro, para sustentar uma vida com sentido.
Quando o autocuidado se desconecta do propósito, ele vira vaidade disfarçada de virtude.
Talvez seja hora de desempenhar menos e sentir mais.
De trocar o “preciso cuidar de mim” por “quero estar em paz comigo”.
De perceber que autocuidado não é plano de metas, um gesto de gentileza.
E se houver uma meta, que seja esta: viver de forma que o cuidado faça sentido — não para os outros, mas para nós.
Que possamos voltar ao gesto de autocuidar como ser gentis consigo mesmos, e não como mais um projeto de otimização. Que o bem-estar valha menos pelo feed e mais pelo sentir. E se for para fazer listas, que seja para eliminar peso, não para acumular expectativas.
Uma ótima semana,
Kayne França.
Ultimamente temos visto como o discurso do bem-estar está em evidência. Nas notícias, nas redes sociais, nos livros e nas conversas durante o café. Fala-se em cuidar de si, desacelerar, respirar. E, de fato, é necessário, urgente e há algo profundamente verdadeiro nisso.
Mas também percebemos uma inversão curiosa: o autocuidado, que nasceu como gesto de gentileza, virou mais uma forma de performance.
Como se o “viver bem” precisasse ser medido, exibido, comparado. E aí, em vez de alívio, nasce mais uma exigência e autocobrança silenciosa, mascarada e sufocante.
Nesse texto de hoje eu quero compartilhar sete percepções — inquietações, talvez — sobre o que me incomoda nesse novo modelo de bem-estar que parece mais preocupado em parecer saudável do que em ser verdadeiro e autêntico.
1. Quando o “cuidar de si” vira uma meta
O autocuidado quando vira uma métrica: número de passos, horas de sono, minutos de meditação… O esporte da moda, treinar de nova, ter um relógio específico…
O gesto que deveria ser suave torna-se cobrança.
E se não faço parte, se falho… me culpo — como se o bem-estar fosse mais uma métrica de produtividade e de fazer parte.
Enquanto o verdadeiro cuidado consigo não se mede, nem se compara, se sente.
2. O autocuidado instagramável
Cenas prontas: velas acesas, livro aberto, xícara de chá, copo de vidro com tampa e canudo — tudo perfeito para o feed.
Só que, muitas vezes, o que é mostrado não é o que é vivido.
Transformamos o descanso em performance estética. Tudo precisa ser mostrado
O “eu me cuido” na verdade se torna “eu me mostro como alguém que se cuida”.
3. Misturar bem estar com estética
Cuidar do corpo é diferente de cuidar da estética. A utilização de termos como “Clean eating”, detox, lifestyle… os suplementos e apps que prometem “corpo saudável = corpo fino”, acabam evidenciando um saudável estilizado, com foco maior em aparência do que em saúde.
4. A comparação com o outro “zen”
Vivemos cercados de pessoas que parecem ter dominado a arte do equilíbrio.
E é fácil sentir que estamos atrasados, que falta algo, que deveríamos estar mais calmos, mais leves, mais plenos, mais alegres…
Mas o bem-estar não é uma competição. É você com você mesmo. Se acolhendo e se respeitando.
Não há ranking da serenidade.
5. O autocuidado vendido como produto
O mercado entendeu rápido: bem-estar dá lucro.
E assim, o “cuidar-se” virou consumo — cremes, apps, retiros, velas, roupas…
Nada disso é errado, claro. Mas é perigoso quando o autocuidado se limita ao que pode ser comprado. Por que ele vai muito além disso.
O cuidado profundo é gratuito: começa no tempo, no corpo, na escuta. No autoconhecimento.
6. O mito da positividade constante
Há quem confunda bem-estar com estar bem o tempo todo.
O cuidado genuíno inclui o desconforto, a pausa, a tristeza.
É possível cuidar-se enquanto se sofre.
Nem todo dia bom precisa ser bonito — basta ser verdadeiro.
7. O esquecimento do propósito
Por fim, talvez o erro mais sutil: transformar o bem-estar em fim, e não em meio.
Cuidar de si é importante, mas para quê?
Para viver com mais presença, para estar disponível ao outro, para sustentar uma vida com sentido.
Quando o autocuidado se desconecta do propósito, ele vira vaidade disfarçada de virtude.
Talvez seja hora de desempenhar menos e sentir mais.
De trocar o “preciso cuidar de mim” por “quero estar em paz comigo”.
De perceber que autocuidado não é plano de metas, um gesto de gentileza.
E se houver uma meta, que seja esta: viver de forma que o cuidado faça sentido — não para os outros, mas para nós.
Que possamos voltar ao gesto de autocuidar como ser gentis consigo mesmos, e não como mais um projeto de otimização. Que o bem-estar valha menos pelo feed e mais pelo sentir. E se for para fazer listas, que seja para eliminar peso, não para acumular expectativas.
Uma ótima semana,
Kayne França.



